quarta-feira, 12 de maio de 2010

Outubro

Estou aqui, sozinha, e recuo até Outubro de 2009. Volto a viver aquele período marcado por fortes incertezas. Lembro-me da decisão que tinha de tomar e de pensar muito nas consequências que qualquer um dos caminhos que eu escolhesse trariam consigo. Lembro-me do primeiro encontro que marcámos. Tão repentino. Nunca te disse, mas eu quase tive um colapso nos momentos que antecederam a tua chegada. Eu, que sempre me queixei da lentidão do elevador do meu prédio, achei que aquela viagem nem um segundo durou. Tinha borboletas na barriga. Saí do elevador e hesitei. Por momentos achei que não teria coragem para te encarar. Mas respirei fundo e avancei. Encontrei-te de costas voltadas para a porta e tentei agir o mais naturalmente que pude. Estava tão nervosa! Passei a tarde toda a evitar olhar para ti. E quando me fazias aquelas perguntas? Só queria um buraquinho onde me pudesse esconder. Andamos muito nessa tarde, lembras-te? Eu sabia que se estivéssemos a andar, não teria de te olhar nos olhos tantas vezes. Depois tu foste embora. E eu fui embora também. Com o coração aos pulos. E mal sabia eu o que iria acontecer nos meses seguintes.
Depois fui para Londres. E nesses dias já bateu aquela saudade, aquela vontade de estar. Gastei o meu saldo todo a falar contigo. Parecia que, sem ti, já não era a mesma coisa. A viagem foi rápida. Quando voltei, só pensávamos em estarmos juntos. Tanto eu como tu, sentíamos que muita coisa tinha ficado por dizer. Muita coisa tinha ficado por acontecer. Eu tinha as minhas dúvidas, os meus medos. Tu sabias da existência deles e sabias, também, que eram eles que não me deixavam avançar. E assim marcámos o nosso segundo encontro. Eu sabia que te queria, mas também sabia das implicações graves que isso me traria. Era domingo, noite de serenata. Voltamos a andar muito, mas desta vez por não haver nenhum sitio aberto perto de minha casa. O nervoso já era mais miudinho, mas as borboletas continuavam a voar na minha barriga. Falamos sobre muita coisa. Desta vez falamos menos sobre nós, sobre as minhas dúvidas. Voltámos a percorrer o mesmo caminho. Deixaste-me à porta de casa. Disseste: "é agora que me vais dar o tal abraço?". Eu abracei-te. Sussurraste-me ao ouvido "Não tens nada para me dizer?". "Eu disse que só dizia se tu dissesses primeiro." "O quê? Que gostas de mim?". "Sim...". "Sim o quê?". "Gosto de ti.". "Gostas?". E beijaste-me. E eu perdi o chão. Fiquei sem saber o que pensar. Pedi-te que não contasses a ninguém. Compreendeste. Foste embora. Entrei em casa e sentei-me no chão, encostada à porta. E pensei no que tinha acabado de acontecer e que aquele beijo, apesar de parecer tão inocente e insignificante, tinha por trás dele um grande presságio.
A partir dessa noite mudou muita coisa na minha vida. Eu tomei uma decisão e tu prometeste que eu não me iria arrepender. Eu acreditei. A partir dessa noite fria de Outubro eu tornei-me uma pessoa diferente. Por isso te digo, aqui e agora, ao som da chuva e desta música que, a partir daquela noite, todos os meses são Outubro e que eu te amo, todos os dias.

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